(“A Mulher e a Casa”,
Quaderna
, frag.)
Destaca-se como princípio ativo dos poemas, uma concepção permanente de
mundo marcada pela emergência de imagens concretas. Por outro lado, estas imagens
cabralinas alcançam planos metafísicos e subjetivos que mobilizam seres que se
definem por desejo e sedução, prazer e dor.
As conformações da subjetividade sofrem deslocamentos figurativos, que se
projetam além de uma postura simplesmente eufórica, de prazer ou de dor pessoal do
poeta. As obras de Cabral, desencadeadas pelo feminino, destacam-se por uma clareza
de corpos e fenômenos que dão visibilidade concreta às forças de sedução e às
conformações do desejo.
Enquanto a subjetividade busca objetivar-se nas intensidades e forças que
distinguem seres e coisas, a percepção poética requer da imagem uma emergência de
mundo, como podemos ver no poema “
A imitação da Água” (Quaderna,
1960):
Uma onda que guardasse
na praia cama, finita,
a natureza sem fim
do mar de que participa,
e em sua imobilidade,
que precária se adivinha,
o dom de se derramar
que as águas faz femininas
mais o clima de águas fundas,
a intimidade sombria
e certo abraçar completo
que dos líquidos copias.
O erotismo como forma poética em João Cabral, procura obter e potencializar as
forças da feminilidade que estão espalhadas por toda parte, aproximando de várias
maneiras a figura da mulher desejada com elementos e seres do mundo, permitindo
inusitadas confluências mulher/mundo. As imagens concretas que reforçam a
sensualidade feminina, expandem-se nas dobras textuais (justaposição, construções
prismáticas), movendo a sintaxe poética à dinâmica dos corpos.