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cinematográfica. O narrador, através dos recursos da descrição, objetiva prender a atenção
do leitor para as ações que estão por vir:
"Nas covas, os grãos esperavam pelas primeiras gotas do céu..."(
7
)
A chuva chegaria a qualquer momento. José da Cruz e os seus amigos
esperavam por ela com uma grande esperança no coração: as coisas mudariam para melhor.
Finalmente teriam um ano de abastança, como há muito tempo não tinham:
"Era pra gente tar a coroar e a mondar. Com sprito sossegado na mão de
Deus..." (
8
)
2.
Da ameaça de seca ao
Dilúvio
O povo caboverdiano sofre muito com a seca e, de vez em quando, com as chuvas
que inundam e desabrigam milhares de pessoas. Quando não sofrem pela estiagem, sofrem
pelo excesso de água. Os escritores procuram fixar esses momentos em suas obras. Manuel
Lopes, por exemplo, em
Os flagelados do vento leste
desejava mostrar a perversidadeda
natureza. Esperando por umas poucas gotas d'água, o que José da Cruz e seus
companheiros receberam foi um violento temporal:
"...fortes bátegas abateram violentamente sobre os campos; como um dilúvio, como
um castigo do Céu: os anjos portadores de água têm também os seus acessos de cólera"(
9
)
Entretanto, Manuel Lopes não se preocupa tão somente em representar a realidade
concreta, como um documento. Como artista, o escritor caboverdiano introduz vários
elementos artísticos, dentre eles a descrição dapaisagem, como no trecho abaixo:
As precipitações são violentas, a chuva cai às bátegas, são baldes que os anjos
despejam à pressa, sem se importarem com uma rigorosa distribuição; as enxurradas abrem
fendas, arrastam a terra vermelha nas vertentes, as ribeiras derramam no oceano o sangue
rico da terra. (
10
)
O narrador aproveita o
motivo anjo
para mostrar o outro lado. O
anjo bom
transforma-se em
anjo mau.
São estes elementos que fazem do texto um texto literário. O
(
7
)idem, p. 23
(
8
)idem, p. 24
(
9
)idem
(
10
)idem, p. 22