A escrita historiográfica, seus protocolos e fontes - page 138

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T
RADIÇÃO
,
FORMAS RITUAIS E SIMBÓLICAS NA TRAJETÓRIA DO DEBATE SOBRE
CULTURA
POPULAR
Pedro Henrique Victorasso
1
O objetivo deste texto é analisar a trajetória do debate sobre o termo
“cultura
popular”
2
tendo em vista que nas últimas décadas essa designação tornou-se alvo de
inúmeras discussões teóricas e metodológicas entre as ciências humanas. As
divergências de interpretações aparecem em estudos de etnógrafos, folcloristas,
críticos literários e historiadores que admitem ser uma tarefa delicada definir o que
seria “popular” e, ainda, se seria plausível uma dicotomia cultural
3
.
Nesse sentido, ao longo do presente capítulo pretende-se apresentar os
conceitos dos principais teóricos sobre o assunto, com o intuito de enfocar essa
1
Mestrando – Programa de Pós-graduação em História – Faculdade de Ciências e Letras
Unesp – Univ. Estadual Paulista – Av. Dom Antonio, 2100, CEP: 19806-900, Assis, São Paulo
– Brasil. Bolsista Capes. E-mail:
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Este conceito traz em seu âmbito o próprio entendimento do que vem a ser “cultura”. Ao longo
da história, a palavra polissêmica
cultura
recebeu novos e distintos sentidos. No entanto, a
cultura pensada como modo de agir, pensar e produzir no seio de uma sociedade foi o
significado que mais gerou inquietações. O termo cultura foi amplamente discutido por vários
setores das humanidades e algumas dessas concepções aparecem no corpo do texto.
Entretanto, os intelectuais que mais se debruçaram sobre o assunto, ao longo dos anos, foram
os antropólogos. Vale destacar, o antropólogo brasileiro Roque de Barros Laraia, que discute a
cultura sob os enfoques antropológicos no livro “Cultura: um conceito antropológico”. Segundo
Laraia, tanto o determinismo geográfico quanto o determinismo biológico falhou na tentativa de
explicar as diferenças entre as sociedades. Para o autor, o comportamento dos indivíduos
depende de um aprendizado, processo denominado endoculturação. LARAIA, Roque de
Barros.
Cultura: um conceito antropológico
, 21º edição. Zahar: Rio de Janeiro, 2007.
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Para alguns historiadores, alinhados a pressupostos marxistas, como por exemplo, E. P.
Thompson, essas manifestações são analisadas como contestação social da classe dominada.
Para outros, como Peter Burke, alinhado à Nova História a cultura é dividida em classes
subalternas (artesãos e camponeses) e classes altas (elite). Já o pós-moderno Roger Chartier,
contrariando a concepção marxista, não compreende a existência de uma dicotomia na cultura;
ele trabalha com o conceito de cultura como representação, o qual almeja analisar como em
diferentes lugares e momentos uma determinada realidade é construída, pensada, dada a ler
por diferentes grupos sociais. Mikhail Bakhtin e Carlo Ginzburg, também discutiram o assunto.
O teórico da literatura russo Mikhail Bakhtin, propõe na década de 1940 o conceito de
“circularidade cultural”,
no qual o autor afirma a coexistência de culturas a partir da análise dos
festejos carnavalescos na Idade Média, onde ocorreria uma inversão da ordem estabelecida,
nesse caso as festas cômicas existiam em oposição às festas oficiais. Nesses eventos havia
integração dos grupos sociais que se influenciavam reciprocamente. Posteriormente o
historiador italiano Carlo Ginzburg, se apropria do termo "circularidade", para falar de uma
comunicação entre a cultura das classes dominantes com as classes subalternas na Europa
pré-industrial. Portanto, esse conceito assinala que elementos da cultura popular interagem
com a cultura de elite, passando às vezes a fazer parte dessa cultura, pois não há uma barreira
rígida entre as culturas.
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