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. Templo é dinheiro?
(28/8/09 – Clovis Rossi – “Templo é dinheiro?”) – O provérbio
modificado pelo acréscimo de um fonema na palavra original (
tempo
) e de um sinal de
interrogação constitui o titulo da crônica, além de finalizá-la. É um dos poucos casos,
até então analisados por nós, de intertextualidade explícita. A crônica refere-se à
facilidade fiscal para a abertura de instituições religiosas, independentemente do lastro
cultural e histórico, doutrina e crença. O cronista comenta as palavras do deputado
Chico Alencar sobre esse fato e finaliza seu texto com o provérbio modificado, citando
sua fonte. Na verdade, o provérbio original foi aproveitado apenas por sua materialidade
linguística permitir um jogo de palavras, pois a palavra “tempo” e seu significado não
coadunam com o contexto geral da crônica, ao contrário do que acontece com a palavra
modificada, já que se trata de instituições religiosas [
templo
] e facilidades financeiras
[
dinheiro
]. Por esse motivo é que se pode pensar em um discurso bivocal divergente que
usa o recurso de apropriação, já que a voz do outro, a do provérbio, é usada fora de seu
contexto habitual, sugerindo novas possibilidades discursivas.
Considerações finais
Este trabalho procurou mostrar como os enunciados proverbiais, típicos da
oralidade, são inseridos em textos jornalísticos. Nessa transposição da língua falada para
a língua escrita, podemos perceber que, à revelia da estrutura formal de cada uma dessas
manifestações comunicativas, o aspecto dialógico desses enunciados é mantido, assim
como seu uso como argumento de autoridade e de adesão, por parte do interlocutor, ao
conteúdo opinativo que o emissor expõe em seu texto.
Percebemos, também, que a voz do provérbio, representante de um enunciador
genérico, de uma memória discursiva, aparece no texto direcionando sentidos
interpretativos convergentes ou divergentes com a voz do locutor e que esse aspecto
muitas vezes tem como suporte intervenções na sua materialidade linguística.
Bibliografia
BAKHTIN, M.
Marxismo e filosofia da linguagem
. Trad. Michel Lahud e Yara F.
Vieira. São Paulo
,
Hucitec, 1992
____________.
Problemas da poética de Dostoiévsky
. Trad. Paulo Bezerra. 3ª ed.
Forense Universitária, 2005.