Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 555

B.2. Apropriação
Schimiti (
idem
, p.57), abalizando as considerações de Romano de Sant’Anna,
afirma que no recurso de apropriação também há um tom discordante entre as vozes do
autor e a do outro, mas esta é empregada fora do seu contexto habitual, buscando um
desarranjo, “uma interrupção da normalidade cotidiana”, o que faz com que se abram
caminhos para uma polemização de seus propósitos, sugerindo novas possibilidades
discursivas.
B.3. Ironia
Também na ironia há um conflito de vozes, no qual o locutor faz uma declaração
literal e outra declaração não formulada, mas que fica subentendida. O discurso irônico,
segundo Schimiti (
ibid
, p.60), apresenta uma voz que assume a defesa de uma
proposição e outra voz que a questiona ou nega essa mesma proposição. Esse recurso
apresenta um papel argumentativo que obriga a participação do interlocutor no
reconhecimento da verdadeira intenção do autor.
Retomando as considerações a respeito do estudo do romance polifônico de
Dostoiévski, Bakhtin mostra que as personagens não são meramente construídas à
revelia pelo autor, ao contrário, o autor do romance polifônico deixa que elas se definam
no embate dialógico com outros sujeitos-consciências (BEZERRA 2008, p.195).
Entretanto, o autor não tem uma função secundária, ele não é passivo porque não se
limita a montar pontos de vista alheios. Ele é profundamente ativo, pois enfatiza sua
relação dialógica com a personagem, entre a “consciência criadora e a consciência
recriada” (
idem
, p.199).
Assim é que, ao romance monológico se contrapõe o romance polifônico no qual
o dialogismo se constrói no reconhecimento do homem na imagem do outro, num
processo de comunicação interativa.
Julia Kristeva (1974), com base no postulado dialógico de Bakhtin, introduz, na
década de 60, o conceito de intertextualidade, concebendo cada texto inserido em uma
sucessão de textos já escritos ou que ainda serão escritos. A Linguística Textual, por sua
vez, incorporou o conceito de dialogismo proposto por Bakhtin no sentido de que um
texto não pode ser compreendido nem avaliado isoladamente, ele está sempre em
diálogo com outros textos (KOCH 2008, p.9), numa relação de seu interior com seu
1...,545,546,547,548,549,550,551,552,553,554 556,557,558,559,560,561,562,563,564,565,...1290
Powered by FlippingBook