Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 345

A concepção pessoal – a qual chamou “deformação” - de
ethos
de Dominique
Maingueneau inscreve-se dentro da perspectiva da Análise do discurso e, mesmo
apresentando muitos pontos divergentes, a noção não é totalmente infiel à concepção de
ethos
aristotélico. Assim, o autor afirma que sua concepção ultrapassa o quadro da
argumentação (MAINGUENEAU, 2008a, p. 64), pois vai além da persuasão pelos
argumentos; a noção de
ethos
permite refletir de forma mais geral sobre a adesão dos
sujeitos a determinado posicionamento.
Para o autor, qualquer texto, oral ou escrito, tem uma
vocalidade
específica que
permite relacioná-la ao enunciador, a um
fiador
que, por meio do seu tom, atesta o que é
dito. A esse fiador atribui-se um caráter e uma corporalidade associados a
representações coletivas sociais valorizadas ou desvalorizadas, entendendo-se por
“caráter” um conjunto de traços psicológicos e por “corporalidade” uma compleição
física e uma maneira de vestir-se. Assim, o co-enunciador
incorpora
essas
representações sociais das quais o fiador é o ator principal. Maingueneau designa o
termo
incorporação
a essa maneira pela qual o destinatário se apropria do
ethos
do
enunciador e, dessa forma, ambos constituirão uma “comunidade imaginária daqueles
que aderem ao mesmo discurso”. Em outras palavras, “o poder de persuasão de um
discurso decorre em boa medida do fato de que leva o leitor a identificar-se com a
movimentação de um corpo investido de valores historicamente especificados”
(MAINGUENEAU, 2005, p. 73).
O discurso pressupõe uma cena de enunciação para ser enunciado e deve validá-
la: ele deve instituir a “situação de enunciação” que o torna pertinente. E é por meio do
ethos
que o destinatário se inscreve nessa cena da enunciação que o discurso do fiador
implica. Maingueneau divide a cena da enunciação em três: cena englobante, cena
genérica e cenografia. A
cena englobante
corresponde ao tipo de discurso, que no caso
do presente estudo, é o político; a
cena genérica
é associada ao gênero, a uma
“instituição discursiva”: debate, entrevista, carta, “santinhos”; por fim, a
cenografia
,
que não está associada ao gênero, é construída pelo texto: em uma entrevista, um
candidato pode falar aos seus eleitores como professor, operário, pai de família. Para
ficar mais claro, pensemos num exemplo: um candidato tem por sua cena englobante o
discurso político e inscreve-se no gênero entrevista; sua fala, que é carregada do
ethos
de homem do povo, usará, para legitimar seu discurso, a cenografia de homem
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