Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 344

locutor λ (sujeito empírico). O sentido de um enunciado viria, assim, da superposição de
diferentes vozes que se confrontam – o locutor L, em seu enunciado, apresenta vários
enunciadores (pontos de perspectiva) e indica a posição que assume em relação a eles.
Dessa forma, Ducrot postula a não unicidade do sujeito e, portanto, a polifonia da
enunciação. Nas palavras do teórico:
o locutor, responsável pelo enunciado, dá existência, através deste, a enunciadores de
quem ele organiza os pontos de vista e as atitudes. E sua posição própria pode se
manifestar seja porque ele se assimila a este ou aquele dos enunciadores, tomando-o por
representante (o enunciador é então atualizado), seja simplesmente porque escolheu
fazê-los aparecer, e que sua aparição mantém-se significativa, mesmo que ele não se
assimile a eles. (DUCROT, 1987, p. 193)
Assim, como já se percebe no excerto acima, a noção de
ethos
como imagem de
si está ligada ao locutor L, já que as “modalidades do seu dizer” podem dizer bem mais
de si do que o que o locutor poderia falar de si próprio. Em outras palavras, o
ethos
se
mostra no ato da enunciação, ele não é dito no enunciado e, por isso, deve ser um plano
de fundo e não objeto do enunciado.
Não se trata de afirmações auto-elogiosas que ele pode fazer de sua própria pessoa no
conteúdo de seu discurso, afirmações que podem ao contrário chocar o ouvinte, mas da
aparência que lhe conferem a fluência, a entonação, calorosa ou severa, a escolha das
palavras, os argumentos (o fato de escolher ou de negligenciar tal argumento pode
parecer sintomática de tal qualidade ou de tal efeito moral). Na minha terminologia,
direi que o ethos está ligado a L, o locutor enquanto tal: é enquanto fonte da enunciação
que ele se vê dotado de certos caracteres que, por contraponto, torna essa enunciação
aceitável ou desagradável. (DUCROT, 1987, p. 189)
Disso depreendemos que o
ethos
está ligado à construção de uma identidade e
que ele é distinto dos atributos reais do locutor. A teoria, então, enfatiza a fala como
ação que objetiva influenciar o outro. Assim, vemos que as teorizações de Ducrot para
referir-se a imagem do locutor e sua argumentação estão muito próximas da noção de
ethos
aristotélico, já que ambas as correntes defendem que é por meio da enunciação
que se constitui a criação de uma identidade/um caráter, fazendo com que o
enunciatário/auditório seja persuadido. Além disso, as duas teorias de argumentação
acreditam que o
ethos
é mostrado no discurso e não dito pelo locutor/orador, de forma
que a sua construção se dá à revelia dos interlocutores. De fato, o autor chega a
mencionar Aristóteles, ainda que para fornecer um equivalente de suas próprias
categorizações e, por isso, acaba por não desenvolver efetivamente sua reflexão sobre o
conceito de
ethos
.
1...,334,335,336,337,338,339,340,341,342,343 345,346,347,348,349,350,351,352,353,354,...1290
Powered by FlippingBook