Página 413 - Anais do IV Seminário Leituras da Modernidade: entornos da poesia

aparece no poema é Madalena, prostituta amparada por Jesus, que a protege e a guia
pelo caminho do cristianismo, absolvendo-a de seus pecados.
O mundo em que essa mulher viveu é caracterizado como um lugar de
desilusão e fingimento, o que culminaria na apropriação desses sentimentos por ela. Um
dos grandes fatores disso é a moda, que exige um padrão de pessoa, que pode, muitas
vezes, não corresponder ao íntimo de cada um. O espelho simboliza a procura intensa
do eu, embora ele só mostre a imagem, o outro. Na última estrofe, há uma possível
comparação entre a cruz e o espelho. A cruz é um grande símbolo de sofrimento e de
salvação. Assim é o espelho, ou seja, para ela o espelho é a sua cruz. A busca incessante
pelo eu causa sofrimento, desestabilizando o eu lírico, que se sente crucificado pela
humanidade e pela moda. Porém, assim como a morte na cruz é esperança de salvação,
ela também acredita que essa busca de si mesma pode salvá-la de seus pecados, de sua
entrega a um mundo tão exigente como o das aparências.
Com as leituras realizadas, podemos concluir que a as representações
femininas de Cecília Meireles não apontam todas para uma única direção. Elas não
retratam apenas uma maneira de ser e agir femininos, mas abrem um leque de
possibilidades. Nos poemas selecionados não há a representação do corpo propriamente
dito, elemento determinante para que a visão acerca da poetisa se realizasse da maneira
que ocorreu.
Ao abordar a mulher, ela aborda também o ser humano, numa espécie de
universalização dos sentimentos, como ocorre no primeiro poema. A multiplicidade do
ser não é decorrente do ser mulher do eu lírico, mas do ser humano. O poema “Auto-
retrato” é um bom exemplo das várias possibilidades de ser mulher que se encontram na
vida e também espelhadas na obra de Cecília.
BIBLIOGRAFIA
BOSI, Alfredo. O ser e o tempo na poesia . São Paulo: Cultrix/Edusp, 1997.
BUARQUE DE HOLLANDA, Heloisa (org.). Tendências e impasses : o
feminismo como crítica da cultura. Rio de Janeiro: Rocco, 1994.