até então desconhecido dos europeus, o do sábio e do filósofo, valoriza a virtude da
magnanimidade, exalta assim o orgulho, e, de certa maneira, a autonomia do sujeito, o
que é incompatível como o ideal cristão da humildade e submissão do dogma, Haroche
(1922) citando o trabalho de Gauthier, Magnanimité (1951), diz que Aristóteles partiu
de “uma reflexão profunda do coração do homem, a aspiração de liberdade... recolocar
seu destino em suas mãos”.
Haroche (1992) identifica na crise da Dupla Verdade o momento de aparecimento do
sujeito de direito. Lembrando aqui que o sujeito-de-direito vai nascer definitivamente
como o capitalismo e com o contrato social que possibilitou o surgimento do sujeito-de-
direito abstrato, como conhecemos hoje. O assujeitamento que era feito pelo viés
religioso passa a ser possível também pelo viés econômico, por intermédio do Direito.
O homem deixa de ser da letra (Bíblia) para ser das letras (os códigos), deixa o templo e
passa a frequentar os tribunais. Liberto pela filosofia de Aristóteles e impulsionado pelo
comércio, esse “novo” homem é um “sem raízes”, vive geralmente fora do lugar de
onde nasceu. Esse burguês precisa comprar, vender, fazer contratos, principalmente, ele
precisa entender e ser entendido de maneira clara, transparente e objetiva e é por meio
da linguagem que se procura operar essa objetividade. Buscando essa objetividade, há
uma dominação progressiva do jurídico sobre o aparelho religioso.
O latim era a língua do dominador romano e na França Monárquica já não justifica seu
uso, o dominador era outro, era o rei. Então, conforme Maurício (2010, citando
Cornette, 2000), a escolha de uma língua oficial se configurou de maneira cada vez mais
precisa, por meio de uma série de textos legislativos que culminaram com a assinatura
em 1539, em uma cidade chamada Villers-Cotterêts, do edito do rei François I, impondo
que a Língua Francesa passe a ocupar o lugar da língua latina, até então utilizada para a
redação dos textos oficiais e jurídicos. O edito conhecido como Ordonnance de Villers-
Cotterêts formava um conjunto de 192 artigos, que visava organizar um verdadeiro
controle da monarquia sobre a sociedade: registro de nascimento, falecimento,
uniformização das práticas jurídicas, etc., obrigatoriamente registrados na língua
imposta pelo rei: “língua materna francesa” e não de outra forma.
O decreto de Villers-Cotterêts prescreve o uso do francês em todos os atos de processo e
de administração, com fins de buscar clareza dos regulamentos e das leis, procurando
assegurar sua compreensão por todos. Haroche (1992) transcreve um trecho do edito.