Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 247

Nele, podemos observar a presença do lexema “negros”, indicando uma determinada
posição-sujeito nos discursos; para essa posição, no interior de uma formação discursiva
específica, temos como recorte de memória dizeres acerca do negro na constituição
racial brasileira. Mais, cria-se, como efeito de sentido, a ilusão de homogeneidade da
população tida como “negra”, ou seja, segundo a qual tal população não teria sofrido
interferência de outras na constituição de sua identidade social e racial. Em outra parte
do texto, observamos o seguinte recorte: “O texto diz que a política de cotas, defendida
pelo Ministério da Educação, cria uma falsa divisão entre negros e brancos”.
Percebemos, claramente, a presença dominante do lexema “negro” significando as
diversas etnias resultantes do processo de miscigenação racial ocorrido, no qual havia a
presença do negro.
Ao enunciar “negro” como significando “mulatos”, “pardos” entre outros,
produz-se um efeito de sentido de deslocamento dessas subjetividades, resultantes do
processo de identificação a essas posições-sujeito para uma subjetividade específica,
qual seja “negro”. Assim, os sujeitos são impedidos de ocupar os lugares de dizer
referentes à miscigenação, como se todos pudessem ser identificados à parcela “negra”
da sociedade. Isso pode ser observado em um comentário presente na matéria
jornalística em questão, ao afirmar a produção de uma “falsa divisão entre negros e
brancos”. Certamente, essa divisão não é tão transparente, mas produzida pelo discurso,
pela linguagem, compreendendo-a como não-transparente, como afetada pelo
simbólico.
Ao se tentar dividir a sociedade bipartidamente, entre brancos e negros,
silenciamos a presença de uma mistura étnico-racial, e apagamos a presença desses
sujeitos (pardos, mulatos, cafuzos, etc.) da constituição racial brasileira. Assim, cria-se
um imaginário de nação pura, ou, pelo menos, de uma nação em que as diferenças
podem ser controladas, pois se restringem apenas a fatores fenotípicos, ignorando-se o
simbólico e a constituição ideológica dos sujeitos.
Podemos, também, pensar em um movimento de negação do preconceito, ao
designar “negro”, “mulato” entre outros por “afrodescendente” ou “afro-brasileiro”.
Seria acreditar que, por meio da mudança das designações, poder-se-ia provocar os
modos de pensar da sociedade, fazendo com que não haja mais preconceito racial no
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