Atropelado por um automóvel do governo brasileiro quando atravessava a Av. Copacabana,
Botto faleceu doze dias depois, no dia 16 de março de 1959, no Hospital Beneficência
Portuguesa do Rio de Janeiro. Seus restos mortais foram trasladados para Lisboa e
encontram-se depositados no Cemitério do Alto de São João. Seu espólio na Biblioteca
Nacional de Portugal (26 caixas contendo 3622 documentos) reúne material dos seus
últimos anos de vida, no Brasil, entre poesia e prosa, correspondência e documentos
biográficos.
O estudo da obra literária de António Botto e de sua fortuna crítica contribui para
compreendermos, de maneira mais ampla e significativa, não só outros aspectos da
produção artística portuguesa da primeira metade do século XX, mas também com que
relevância sua estadia de doze anos no Brasil e o contato com grandes escritores brasileiros
interferiram em suas derradeiras produções. Não seria presunção ou exagero, a partir dessa
breve apresentação, atribuirmos a António Botto uma posição de destaque entre os grandes
poetas portugueses do início do século XX. Entretanto, o que verificamos em grande parte
dos manuais de história de
literatura portuguesa, bem como em antologias de poesia modernista, é uma postura de
silêncio
por parte da crítica que, se não disfarça a incompreensão e o menosprezo, tenta
evitar o embaraço ainda provocado pelo seu tom polêmico. É surpreendente notar que,
mesmo depois de meio século da morte do poeta, sua produção completa ainda não foi
publicada e seus poemas continuam relativamente desconhecidos.
Aspectos da poesia de António Botto
A fortuna crítica de que dispomos – da segunda metade do século XX à mais
contemporânea – tende a focalizar o teor homoerótico dos poemas, especialmente
fundamentado por aspectos de ordem biográfica. Em nosso trabalho, ressaltaremos a
investigação do tema erótico, tão caro ao poeta, pela perspectiva da encenação, por meio
das marcas de teatralidade utilizadas no processo de criação poética. Botto constrói, em sua
poesia, um sujeito lírico que apresenta consciência de diferentes “instantes”
(BACHELARD, 2007). Entretanto, tal desdobramento do sujeito lírico não se restringe ao
tempo; mas, antes, expande-se ao conjunto de fatores externos
(a construção de um cenário, de interação com outros personagens) e de internos
(pensamentos, reflexões, devaneios). O poema, assim, pode ser considerado uma colagem
ou uma intersecção dessas duas instâncias – interna e externa –, evidenciando o caráter de
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