do consumo tido como distinto, por ser raro e exercido pelas classes superiores da
sociedade. Quanto ao consumo de bens materiais, Bourdieu opõe os gostos de luxo ou
de liberdade aos gostos de necessidade: os primeiros são próprios dos indivíduos que
são produto das condições de existência definidas pelas liberdades e/ou facilidades que
a posse do capital assegura; as últimas exprimem as necessidades dos menos
favorecidos pelo capital econômico. Para Bourdieu, o termo “gosto de necessidade”
chega a ser um paradoxo, visto que a idéia de gosto está intimamente ligada à idéia de
liberdade – por isso é uma noção tipicamente burguesa, pois supõe uma liberdade de
escolha.
Destacamos aqui os traços do
ethos
burguês e seus valores predominantemente
projetados pelas personagens, que estão relacionados à
cenografia enunciativa
da peça,
ao
posicionamento
de Alexandre Dumas Filho no discurso literário e à sua posição no
campo literário
. Nota-se uma predominância deste recurso no primeiro ato, como uma
forma de montar as bases para que o leitor se situe geográfica e socialmente, suprindo
assim a ausência de didascálias. Porém, cabe, inicialmente, definir a burguesia francesa
do período em questão.
Referimo-nos a burgueses, aqui, como uma classe social estabelecida como tal, ou
seja, como um grupo que se diferencia de outro por seu lugar no sistema historicamente
determinado da produção e por seu papel na organização social do trabalho (Cardoso
1992, p. 127). A burguesia francesa, no período pós-revolucionário, destaca-se da
grande “massa” do Terceiro Estado, adquirindo ideologia própria e consciência de
classe, diferenciando-se do povo. Trata-se, portanto, de uma classe emergente cujo
crescente poderio econômico e político deve ser projetado nas artes.
Adeline Daumard (1970) vai esmiuçar as características deste grupo de acordo
com as condições de vida material, as origens sociais e a formação intelectual e moral,
as reações e o comportamento individual e coletivo. Segundo a autora, no topo da
pirâmide social estava a aristocracia financeira que chegou a esta posição depois da
Revolução de 1830. O banqueiro, o grande industrial, o grande negociante são por
excelência os representantes desta categoria. Por outro lado, há ainda a classificação de
alta burguesia, cujos representantes estavam em contato muito estreito com a
aristocracia financeira, tornando difícil a distinção. No entanto, estes não tinham, em