de classe. Os habitus secundários, tais como o habitus escolar, integram-se ao primário,
e embora as aquisições mais recentes sejam condicionadas pelas mais antigas, o habitus
não cessa de se ajustar em função da nova realidade de vida, da trajetória de cada
indivíduo.
É por esta razão que, segundo Bonnewitz, o habitus se apresenta como uma
mediação entre as estruturas objetivas e os comportamentos individuais, ultrapassando a
questão da oposição objetivismo/subjetivismo:
Nossas práticas não são simples execuções das normas explícitas, mas elas traduzem
um senso do jogo que adquirimos por meio do habitus, o senso prático, definido como a
aptidão para se mover, para agir e para se orientar segundo a posição ocupada no espaço
social, segundo a lógica do campo e da situação nos quais se está implicado, e isso sem
recurso à reflexão consciente, graças às disposições adquiridas funcionando como
automatismos (BONNEWITZ, 2002, p. 62).
A prática coletiva deve sua coerência e sua unidade ao efeito do habitus; ele gera
uma ilusão de escolha nas práticas e representações, embora os indivíduos não façam
mais do que repetir o habitus que os modelou. “Todas as práticas e as obras de um
mesmo agente são objetivamente harmonizadas entre elas, sem qualquer busca
intencional de coerência [...]” (BOURDIEU, 1979, p. 192). É esta harmonia que
fundamenta as diferenças nos estilos de vida na sociedade: os membros da classe
dominante apresentam um habitus associado à noção de distinção; a pequena burguesia
destaca-se pelo desejo de ascensão social, as classes populares têm um habitus marcado
pelo senso de adaptação às privações materiais e pela valorização da força física, e
assim por diante.
Os estilos de vida são um produto do habitus e tornam-se sistemas de signos
socialmente qualificados, adjetivados. A relação dialética que se estabelece entre as
condições e os habitus está na raiz do processo que transforma a distribuição do capital,
produto de uma relação de forças, em distribuição de capital simbólico, ou seja, em
sistemas de diferenças sociais e comportamentais perceptíveis.
Tais comportamentos e práticas são analisados por Bourdieu em
La distinction
(1979), e demonstram como até mesmo o consumo, seja de bens materiais ou culturais,
é um traço característico destes estilos de vida. No que se refere ao consumo cultural, o
autor distingue o consumo considerado socialmente vulgar, assim chamado por ser fácil
e comum, exercido pelos indivíduos mais desprovidos de capital econômico e cultural,