malfeito sem conseqüências (...). (ELIOT 1959, p. 146-147)
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(tradução nossa da versão
francesa)
A principal diferença entre a réplica de T. S. Eliot, destinada ao crítico
Aldington, para as réplicas de Foucault, reservadas ao professor Pelorson e ao jornalista
George Steiner, encontra-se na questão de T. S. Eliot estabelecer uma defesa da
literatura de um outro autor, que ele acredita ter sido mal compreendido, enquanto
Foucault faz a defesa de seus próprios escritos.
A constituição de um grupo oficialmente admitido para pronunciar determinado
discurso, detentor de uma linguagem especializada perante uma obra de arte literária, e
que só pode ser contestada por outro grupo (também institucionalizado) que não
compartilha da mesma linha de pensamento para se pensar a obra, acrescenta-nos uma
problematização, em termos foucaultianos, que perpassa a relação de poder no que diz
respeito à institucionalização do saber.
De acordo com Bourdieu (1996, p. 143),
As diferenças segundo o
grau de consagração
separam de fato
gerações artísticas
,
definidas pelo intervalo, com freqüência muito curta, por vezes apenas alguns anos,
entre estilos e estilos de vida que se opõem como o “novo” e o “antigo”, o “original” e
o “ultrapassado”, dicotomias decisórias, muitas vezes quase vazias, mas suficientes para
classificar e fazer existir, pelo menor custo, grupos designados – mais do que definidos
– por etiquetas destinadas a produzir as diferenças que pretendem enunciar. (grifos do
autor)
Quando focalizamos a consagração institucional da obra literária na academia,
observamos um procedimento específico em relação ao campo literário. Observamos o
romance literário como objeto de deleite estético e entretenimento do público leitor e,
paralelamente, notamos esses grupos institucionalizados que se remetem aos romances
particularmente a partir de critérios (retóricos, sociológicos, históricos, filosóficos,
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Na versão francesa: “Les critiques adressées à Ulysse par M. Aldington il y a quelques années, me
semblent pécher par la même inattention, mais M. Aldinton les ayant formulées avant la parution de
l´oeuvre complète, son échec est plus honorable que les essais de ceux qui avaient devant eux le livre
entier. M. Aldington traita M. Joyce de prophéte du chaos (...). Um fort bon livre peut avoir une influence
néfaste ; un autre, médiocre, peut en l´occurence être des plus salutaires. (...) un homme de génie est
responsable devant ses pairs et non devant une chambrée d´imbéciles sans discipline ni culture.
Néanmoins, la pathétique sollicitude de M. Aldington à l´égard des simples d´esprit me semble comporter
certaines implications sur la nature de l´ouvrage (...). Si j´ai bien compris, M. Aldington tient l´ouvrage
pour une invitation au chaos, une expression de sentiments pervers et partiaux, et une défiguration de la
realité. (...) Qu´il soit possible de
diffamer
l´humanité (...), c´est là matière à controverse pour sociétés de
philosophes; mais il est évident que si Ulysse constituait une “diffamation”, ce ne serait qu´un document
forgé de toutes pièces, une malfaçon sans conséquences (...).”