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Trata-se de uma carta escrita por um preso que se ampara no seu direito em
escrever para registrar o seu desabafo pessoal. Na posição de presidiário, o sujeito se
manifesta com gestos resistentes ao escrever para a instituição, pois a mesma não está
endereçada para um destinatário específico e sua finalidade é criticar o sistema, os
políticos, a instituição prisional, bem como, sua condição social e econômica.
Ao enunciar o seu perfil enquanto
sem estudo, desempregado e de raça negra
enquanto justificativa para a prática de seus atos ilícitos e como consequência disso
ficará por 20 anos na prisão, houve uma quebra do ritual pré-determinado em que não se
deve criticar a instituição para que sua carta chegue ao seu destino sem ser barrada, pois
nesse caso, a carta já estava no seu ponto de partida e de chegada, não havendo
necessidade de se submeter às normas.
No entanto, esse sujeito se marca pela resistência ao denunciar a sua condição
social enquanto perfil ideal para ser absorvido pelo sistema prisional, ou seja, um
espaço que serve para conter aqueles que não se adequam à lógica do mercado e, por
isso, não tem condição de viver em sociedade.
A resistência vai sendo produzida no funcionamento da língua com os
xingamentos, a revolta, a denúncia, o desabafo, o desvelar da sua condição social e da
sua raça. A lógica do mercado exige competitividade e atrás de um emprego está a
formação e qualificação para tal; se não as tem, as dificuldades para conquistar uma
vaga será maior. Outra questão é quanto a raça do sujeito segregado.
Há uma interdiscursividade sobre a condição da raça negra no Brasil que vem à
tona no enunciado
preto
e
mais um preto mofano na prisão
pelo longo período em que a
raça negra viveu na condição de escravo, da libertação da sua condição para pessoas
“livres”, mas sem a preocupação do sistema em adequá-las na sociedade, de que sua
posição continua inferior em situação às pessoas de outras etnias e que sua trajetória se