Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 108

como saberes verdadeiros sobre o que é ser mulher em múltiplas temporalidades e em
diversos espaços. Mais precisamente, pretendo aclarar certos entrecruzamentos de
discursos e os efeitos de sentido daí decorrentes que legitimam saberes, instituem
poderes normatizadores, constroem simulacros e paradigmas, circunscrevendo dois
movimentos identitários da mulher no discurso publicitário: mulher Eva e mulher
Virgem Maria.
Sobre o conceito de verdade
O ponto basilar sobre o tema em questão é que, para Foucault, trata-se sempre de
uma verdade historicamente construída que muito se distancia da concepção de verdade
metafísica e transcendente, já que “a verdade é deste mundo; ela é produzida nele graças
a múltiplas coerções e nele produz efeitos reguladores de poder” (Foucault 1979, p.12).
Trata-se, igualmente, da verdade que implica a constituição/fabricação do sujeito, que
delineia identidades e insere o indivíduo em práticas, inventando os seus
eus
.
Aproximar-se, ou mesmo desvelar um conhecimento verdadeiro, sempre foi uma
meta para os filósofos e, de modo mais intenso, a partir de Descartes. Foucault (1979,
p.156), na esteira de Nietzsche e em face da tradicional questão filosófica “qual o
caminho mais seguro para a verdade”? propõe: “qual foi o caminho aleatório da
verdade?”. Assim, se antes se questionava a relação entre o sujeito e a verdade a partir
de uma ideia de essência interior, tentando entender quais seriam os fundamentos
necessários, para que se pudessem desvendar as verdades sobre o mundo, com
Nietzsche e, depois, com Foucault, passa-se a questionar quais seriam os processos
históricos implicados na fabricação de discursos de verdade. O problema não seria mais
pensar a subjetividade cartesiana, o do
cogito-ergo-sum
, segundo o qual o sujeito seria
originário, transparente a si mesmo, autônomo, instância fundamental e apto a construir
um conhecimento verdadeiro ou a construir um domínio de verdades inquestionáveis e
inquebrantáveis, mas o de descrever historicamente os procedimentos pelos quais
discursos verdadeiros alienam, seduzem, divertem, condenam, informam e,
principalmente, transformam todos nós e cada um de nós em sujeitos (Gros 2003). Em
outros termos, na perspectiva foucaultiana, são as produções históricas de discursos que
constroem subjetividades e fixam a(s) verdade(s) do/sobre o sujeito, constituindo-o.
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