Todas as formulações em torno da verdade, apresentadas ainda que
sumariamente aqui, levam irremediavelmente à análise do discurso, ao acontecimento
discursivo, à necessidade de se considerar a existência histórica e material dos discursos
em sua heterogeneidade, para que os efeitos da verdade possam ser apreendidos em sua
dispersão, ou melhor, para que seja possível: (i) desestabilizar lugares de verdade e as
redes de poder ali tramadas; (ii) dar visibilidade aos jogos das diferenças, às relações e
aos desdobramentos das batalhas sociais em busca das verdades que contribuem, dentre
outras questões, para o desenho dos contornos identitários dos sujeitos.
É no bojo dessa complexidade que situarei, na sequência, o discurso publicitário
como algo que irrompe na contemporaneidade, para apreendê-lo como acontecimento,
no interior da formação discursiva, com vistas a descrever sua condição de existência e
seu sistema de dispersão. Mais do que isso, empenhar-me-ei em dar visibilidade às
verdades circunscritas em redes de poder que definem o ser mulher à luz de modelos
bíblicos.
Ser Eva ou Virgem Maria na publicidade
Partindo do princípio de que os “eus” da nossa sociedade são
incontornavelmente produzidos pelas e nas práticas discursivas e de que a publicidade,
ela mesma uma dessas práticas, é um importante suporte institucional legitimado para
poder dizer aquilo que funciona como verdadeiro, já que o que ela diz exerce sobre
outros discursos uma forma de pressão, uma coerção, silenciando alguns dizeres e
reverberando outros tomados como verdadeiros, chamo a atenção para as duas posições
de sujeito mulher em destaque nas seguintes peças publicitárias.