Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 464

O sujeito enunciador é marcado por um discurso e por relações sociais que
impõem à mulher uma identidade feminina assinalada por um lugar de submissão. Não
se ousa questionar a condição de desvalorização e restrição da mulher, assim, acaba por
submeter-se e colocar-se em um espaço ideológico e discursivo regrado e dominado por
um posicionamento sexista. Isto é, a voz ideológica determinada pelos valores da
formação discursiva a que se associa o sujeito é povoada pela reiteração de discursos
arraigados na memória coletiva e que constituem uma barreira quase intransponível,
uma posição ideológica e social colocada pela hegemonia do masculino.
Na amostra discursiva aqui analisada, aparecem indicadas, como já afirmado
Pêcheux (1997, 2009), outros discursos que compõem o discurso do mesmo, ou seja, a
interdiscursividade. Ainda que se cristalizem outras vozes discursivas, como a formação
discursiva familiar, jurídica, capitalista e midiática por meio da materialização de
vocábulos como
“escola, feira, cabeleireiro, mamãe, sobrinhos, titia”
(formação
discursiva familiar),
“justo”
(formação discursiva jurídica) e
“tenha e só para ela”
(formação discursiva capitalista), o discurso estudado ressalta uma adesão à formação
ideológica sexista, da valorização do masculino e inferiorização do feminino. Assim,
distancia-se e subverte-se a formação discursiva feminista que atravessa o discurso, mas
que é silenciada, a fim de enunciar de um lugar masculino de superioridade, força,
racionalidade e poder que não deve ser questionado socialmente por homens e,
sobretudo, por mulheres.
Não podemos deixar de tratar a emergência de um subentendido
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na construção
do discurso analisado. No enunciado
“Não é justo que ela tenha um Volkswagen só
para ela”
, podemos perceber o implícito de que mulher é merecedora de um veículo tal
como o homem, devido a sua atuação social, sua submissão e silenciamento que tornam
suas ações adequadas ao esperado. Ela merece, é justo que seja presenteada com o
veículo, pois assume seu papel social de modo adequado.
Quanto à linguagem verbal do anúncio, observamos que ela é também
responsável pela cristalização de uma identidade feminina e, por decorrência,
masculina. No anúncio analisado, o homem é colocado ao lado do carro de forma
imponente e superior, assim, ele está voltado para frente, bem vestido, com uma maleta
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Como afirmado por Maingueneau (1996), o implícito desempenha um papel extremamente
relevante na construção de efeitos de sentidos, uma vez que enunciar e produzir sentidos, nem sempre é
materializado, é sim uma atividade discursiva que entrelaça dito e não-dito.
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