Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 117

Segundo Perrot (2007), declarou-se nessa época uma verdadeira guerra à
mortalidade infantil, ao mesmo tempo em que se criou uma medicalização da
maternidade e da primeira infância, passando, mãe e criança, a serem um interesse
político e nacional. Afloravam, então, discursos que visavam convencer as mulheres de
sua importância com relação aos cuidados com o filho e, para convencê-las, tomavam
como parâmetro os discursos religiosos que exaltavam, adoravam o modelo da Virgem
Maria. Com efeito, no discurso da PP2 ressoam, produzindo efeito de memória, esses
discursos que subjetivaram a mãe abnegada, dócil, comedida e disposta a qualquer
sacrifício para garantir a felicidade e o bem estar de seu filho. Quer dizer, no enunciado
o melhor lugar para o seu bebê ontem, hoje e sempre
(PP32),
retorna a voz dos médicos
e outros que orientavam para a necessidade de a mãe ficar com seu bebê e de
amamentá-lo. Silenciam-se quaisquer outras verdades desviantes dessa rede de
formulações.
Considerações finais
Confrontada com a materialidade das peças arregimentadas para este estudo e
com as verdades que os discursos ali enunciados convocam, quero concluir reiterando
que a existência de enunciados nunca é fortuita ou aleatória, tampouco é o resultado de
uma intenção; estão ali excluindo outros enunciados e se correlacionando com outros
tantos, todos articulados em um campo de coexistência. Estão, portanto, inseridos em
um
“domínio associado” de outras formulações, que são repetidas, refutadas ou mesmo
negadas, produzindo efeitos de memória específicos (Foucault 2007).
Além disso, vale sublinhar que toda produção discursiva passa pelo crivo de um
controle, de uma seleção; é organizada e redistribuída de acordo com os mecanismos
que determinam o que pode ser dito em certo lugar e em certo momento histórico. A
depender disso, alguns dizeres são silenciados, outros, reverberados como discursos
verdadeiros. À luz desse procedimento de controle do discurso, chamei a atenção para a
(re)invenção dos dois famosos modelos de mulheres bíblicas: Eva e o seu oposto, a
Virgem Maria. Quando uma é exaltada a outra é estrategicamente apagada, mas ambas
coexistem, formatando uma matéria memorável e, consequentemente, repetível
exaustivamente no universo publicitário, perpetuando movimentos identitários do
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