Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 1082

No entanto, o escritor que repete modelos já existentes, escrevendo “à la
Balzac”, considera a forma literária de Balzac como sendo a “verdadeira forma
literária”, como se esse modelo exercesse uma força transcendente sobre o ato da
escrita. Esses escritores estariam condenados a executar apenas obras que seriam
exercícios de estilo, inscritos numa perspectiva estática na história da literatura e se
colocariam num plano de descontinuidade em relação à ordem de sensações a serem
expressas. Ao invés de “transe”, o ato de escrever se revelaria como um exercício de
estilo, isto é, a reiteração de uma forma padronizada, isto é, morta (“
figée
”).
Como “escrever” supõe também, ao mesmo tempo, uma ancoragem no presente,
onde o não-sujeito evolui no tempo da experiência (“
une prise sur le présent
”, diriam
Coquet/Merleau-Ponty e Benveniste), escrever também é, como dissemos, um processo
assumido, sobretudo, pelo sujeito (“
une reprise de l’ expérience vécue par le non-sujet
”,
diria Jean-Claude Coquet). O ato de escrever supõe também, vale repetir, um processo
de estabilização. Nós dissemos no capítulo I que, para Nathalie Sarraute, escrever nos
cafés a ajudava a se colocar numa relação com a escrita na qual se pode afirmar que ela
era sujeito da sua escrita.
É por meio de um movimento empreendido pelo sujeito que a experiência do
não-sujeito está atualizada em palavras. No ato de escrever, o sujeito está velando, mas
o não-sujeito se re-vela e a forma literária é o despertar de uma força imanente.
Concluímos este trabalho com uma formulação que encontramos em francês e que
revela, pela sonoridade, por meio da interação entre os significantes, a relação entre
todas essas noções:
Le sujet
veille
, mais le non-sujet
s'éveille
dans l'acte d'écrire. La
forme littéraire est le
réveil
d'une force immanente
. A dificuldade do ato de escrever é,
para Nathalie Sarraute, a dificuldade de dar conta, através do descontínuo que
representam as palavras repertoriadas na língua, do contínuo da experiência humana
vivida pelo não-sujeito – sobretudo da experiência dos tropismos, por meio de uma
forma que seja a figura de uma força imanente.
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