Voltando à análise de Jean-Claude Coquet sobre os ideogramas ocidentais,
podemos dizer que “onde o linguista instaura uma separação primária entre o universo e
a língua, separação secundária entre a fala e a escrita, o usuário apenas vê,
ingenuamente, na sua prática – ou só vê o que ele quer em termos de conjunção e
equivalência”. Paul Claudel afirma que “o mundo e eu fazemos parte de um conjunto
homogêneo” – esse é o traço universal da função poética
10
.
Nathalie Sarraute, em um dos seus textos teóricos, chamado
Roman et Réalité
,
aponta para essa consciência da conjunção do usuário com a língua e o mundo quando
diz que, se uma forma literária não criasse os elementos dispersos que compõem a
realidade, eles se manteriam invisíveis
11
num magma, pois a realidade
12
para o
romancista é o desconhecido, é o que parece ser visto pela primeira vez por ele, o único
a vê-la, é o que não se deixa expressar por formas conhecidas e já utilizadas. Mas é o
que exige para ser revelada de um novo modo de expressão, de formas novas.
Nathalie Sarraute procura tornar heterogêneo um universo aparentemente
homogêneo, e cada forma literária nova criaria assim heterogeneidade, destacando
elementos invisíveis e tornando-os visíveis, como na situação de apagamento eventual
da letra “t” em “
C’es Antonin
”, pois a letra “t” não tem o mesmo estatuto ao longo do
texto.
Análise do texto I de
Tropismes
O texto I de
Tropismes
traz alguns temas recorrentes na obra de Nathalie
Sarraute. Nele é descrito o movimento de uma massa amorfa referenciada por um
simples “
ils
”
13
:
10
Coquet 1972, p. 397.
11
“O trabalho do romancista é uma procura que tende a desvendar, a fazer existir uma realidade
desconhecida (...) a obra de arte, dizia Paul Klee, ‘não restitui o visível. Ela torna visível.’” (Sarraute
1996, p. 1644.)
12
Sarraute 1996, p. 1644.
13
Valerie Minogue (1981) chama a atenção para a importância desse texto na obra de Nathalie
Sarraute em
Nathalie Sarraute and the War of the Words: A Study of Five Novels
.
