Esse modo teatral da pregação do Fradinho - como o de muitos pregadores do seu
tempo - entroncava com a maneira medieval, que não era menos recatada. É, efetivamente,
nos veios medievais que vai o frei buscar as fontes inspiradoras das suas obras espirituais,
mas é num certo estilo de vida falso e langoroso da época, de que são expressão extrema os
frequentadores das grades do convento, que assimila certas expressões de piedade melíflua.
Essa busca de efeitos teatrais e a ênfase e demagogia do tom de Frei António das Chagas
foram alvo de inúmeras críticas do Padre António Vieira, que o suspeitava de incitar o povo
contra os cristãos-novos, e de D. Francisco Manuel de Melo, seus contemporâneos.
A personalidade de Frei António das Chagas exerceu sobre os seus
contemporâneos um fascínio perturbador, resultante, sem dúvida, do seu estatuto de homem
mundano convertido à causa de Deus. O empenho combativo e radical de Frei António das
Chagas contrastava grandemente com a ligeireza e o relaxamento de costumes que, com
alardeamento público, vivera na juventude. A sua atitude penitente sob o hábito de S.
Francisco bastava para atrair multidões aos lugares por onde passasse.
Esse comportamento chamava a atenção e parecia se ajustar às características dos
fiéis da época, que enxergavam no religioso um auxílio aos problemas mundanos, cotidianos e
espirituais. O autor matou um desafeto num duelo, além de, por pouco não morrer de uma
enfermidade; talvez essas ocorrências tenham feito com que sua visão irresponsável de mundo
se tornasse uma maneira totalmente nova de enfrentar desafios e lidar com as pessoas.
1.3. Sobre a obra de Fonseca/Chagas
António das Chagas viveu em um tempo em que os religiosos detinham muito
conhecimento e o povo tinha muito respeito por eles. O frei produziu sermões
contemporâneos de Vieira para aconselhar seus fiéis, baseando-se em histórias que ouvira ele
próprio e outras vivenciadas por colegas eclesiásticos.
Sua retórica era rica em recursos e muito admirada e eficiente. Há relatos que dão
conta de que o frei chegava a atirar objetos nos fiéis, tamanho era seu compromisso com a
representação na oratória, ao pregar de seu púlpito durante as missas.
Os modelos empregados na escrita nessa época eram baseados em manuais de
poética e retórica antigas. Aristóteles, com sua retórica, foi um instrutor importante para
aqueles que trabalhavam com as palavras. Havia, também, tratados de agudeza como os de