Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 260

que um conjunto de crenças/noções/saberes que justificam a prática jurídica. A doutrina
é um porto seguro, um lugar conhecido, ideologicamente aceitável, confortável e que
opera, afim de justificar as decisões jurídicas. Usando as palavras de Warat (1979, p.
48-57) “O saber jurídico emana da necessidade de justificar a ordem jurídica, e não
explicá-la”, ou seja, o operador jurídico respaldado pela doutrina torna-se um mero
“chancelador” de práticas usadas por uma maioria e não um “questionador” ou
“construtor” de novas maneiras de interpretar. Ele se fecha à novas possibilidades,
novos caminhos de interpretação da lei. Como consequência, as mudanças no Direito
são cosméticas e não atingem o fim social a que se destinam e isso se torna dramático
quando se tem a convicção que o Direito é social e movimenta, tentando acompanhar os
movimentos da sociedade.
Na televisão, nada se cria tudo se copia ou ainda “o uso do cachimbo faz a boca
torta”
Como surgiu o Direito moderno e com que propósito, Haroche (1992) já deixou bem
claro e foram citadas inúmeras passagens neste trabalho. O motivo do uso de uma
língua hermética, da ritualista mágico-religiosa que não estava ao alcance do
entendimento de todos, também está explicitado aqui. Para ilustrar, um trecho de
Brunot, que cita o advogado Belot,
O principal argumento de Belot (escreve Brunot), refere-se ao fato de ser de primeira
importância manter as ciências escondidas. O conhecimento que se dá aos povos teve
como consequência, na religião, a heresia; na filosofia, a sofistica; na política, a
insubmissão e a decadência (citado por HAROCHE, 1992, p. 89).
A intenção de sonegar informações ou de dificultar sua circulação, colocando-a ao
alcance de poucos eruditos privilegiados tem se mantido até hoje, como bem ensina
Streck (1999), com seu “porte ilegal da fala” ou processo de “produção da fala
autorizada”, ou mesmo Warat (1979) com seu “senso comum teórico dos juristas”.
Além dessa intenção, há o que chamamos ideologia, que é o que fazemos
inconscientemente, sem nos apercebermos da real intenção. Resumindo, o que é
ideologia,
Ideologia é, ai, um sistema de ideias, de representações que domina o espírito de um
homem ou um grupo social, complementado com o de Chaui (1980) que diz que são
referentes que “fixam e prescrevem de antemão o que se deve e como se deve pensar,
agir e sentir (ALTHUSSER, 1985, p. 81).
A ideologia é necessária para justificar os nossos atos, mas ela age de maneira
imperceptível, e como diz Althusser (1985), as pessoas jamais admitem que estejam
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