Jornal Nosso Câmpus - Ano XI ed. 38 - março de 2018 - page 2

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Novos personagens na história
para o Oeste Paulista
As pesquisas feitas em ciências
humanas têm recuperado histórias de
grupospoucoconhecidoseredimensionado
o estudo das experiências vivenciadas
pelos grupos populares em regiões até
bem pouco ligadas a uma história das
populações que viveram no período de
colonização do Oeste Paulista. Nesse
sentido é interessante dar um exemplo
deste processo. Quando o dia 13 de maio de
1888 terminou, o dia seguinte trouxe uma
grande movimentação de ex-escravizados
e também de antigos proprietários destes,
que agora tinham de reelaborar o trabalho
em suas propriedades. Pouco se sabe,
contudo, sobre a vida de grande parte da
população negra, que ficou livre emSão Paulo.
Essa região possuía, até o final da
escravidão, o terceiro maior contingente de
pessoasescravizadasdevidoànecessidade
de braços para o trabalho do plantio de
café, menor somente do que o contingente
somado das províncias da Bahia, Rio de
Janeiro e Minas Gerais. A relativa ausência
de estudos sobre essa população e uma
notável escassez de registros documentais
do período pós-abolicionista nos moveram
a procurar, na importante documentação
da Comarca de Assis, depositada no
CEDAP (Centro de Documentação e Apoio a
Pesquisa), pistas sobre possíveis caminhos
dos libertos e seus descendentes na região
do Oeste Paulista ou a chamada “Boca
do Sertão” assim denominada em fins do
século XIX e início do XX.
Conhecida como “Boca do Sertão”, a
região geográfica, onde hoje se localiza o
Oeste de São Paulo na década de 50 do
século XIX, era conhecida pelo “vazio”, pelo
não-pertencimento do colonizador, pela
presença de nativos “não civilizados”. Toda
a região localizada a oeste de São Paulo,
para além de Campinas, era o sertão, ou
como se chamou “Novo Oeste Paulista”.
Região de intenso conflito entre as
populações nativas e os recém-chegados,
conflitos sangrentos nos quaismuitas vidas
foram ceifadas, sabendo-se mais tarde que
população foi quase dizimada, certamente
a nativa (FERNANDES, 2003: 14-15).
A história dos “pioneiros”, homens
que se lançaram nas matas ainda pouco
conhecidas como no caso do oeste de São
Paulo, encontraram a terra povoada pelos
indígenas, por mestiços e também por
negros. Sabemos que eles foram parte dos
grupos que iniciaram cidades e a sociedade
brasileira e fizeram parte do processo nada
tranquilo de colonização que insistiam em
chamar as terras por eles ocupadas de
Sandro Roberto Valentini
Reitor da Unesp
Sergio Roberto Nobre
Vice-reitor da Unesp
Andrea Lucia Dorini de Oliveira Carvalho Rossi
Diretora da Faculdade de Ciências e Letras (FCL)
Catia Inês Negrão Berlini de Andrade
Vice-Diretora da Faculdade de Ciências e Letras (FCL)
Cláudia Valéria Penavel Binato
Coordenadora do JNC
ESPAÇO DOCENTE
“vazio demográfico”. A região chamada de
Novo Oeste Paulista se constituiu em uma
das últimas regiões de São Paulo a ter a
expansão marcada por diversos fatos que
moldarama construção desse espaço social.
Mas quem eram estas pessoas que
fizeram parte da população antes da
colonização, antes das cidades?
As pesquisas mostram que havia
indivíduos de diversas origens; soldados
que desertaram da Guerra do Paraguai,
libertos e homens brancos pobres, que
fugiam do alistamento forçado, pessoas
que vinham em busca de um pedaço
de terra, enorme atrativo para essas
pessoas (MONGEIG, 1984: 133). A forma de
sobrevivência eram culturas agrícolas de
subsistência, um acanhado comércio local
e grande isolamento.
Com a construção da Estrada de
Ferro Sorocabana em 1914, novos grupos
populacionais, entre os quais homens
e
mulheres
recém-libertos
e
seus
descendentes, se dirigiram, emmassa, para
a “Boca do Sertão”. Ouvindo as promessas
e prodígios de facilidades e fartura nas
novas terras ainda por serem desbravadas,
uma multidão de indivíduos se lançou à
empreitada e passou a viver ao lado de
outrosquefaziampartedosgrupospopulares.
As últimas pesquisas assinalam
que junto a esses grupos se somaram
muitos imigrantes, que também vieram
compartilhar os mesmo sonhos. Dessa
grande amálgama nasceram laços e
conflitos que teceram as cidades do Oeste
Paulista. Compreender esse processo
nos permite não só entender melhor a
construção do meio social, econômico e
político,mastambémvalorizarassingularidades
desse espaço recuperando os diversos
protagonismos e rompendo o silenciamento
dos grupos que foramesquecidos.
w
Foto: NEAA/UEL
L
úcia Helena Oliveira Silva fez História pela
PUC-Campinas, mestrado em História da
Educaçãosobreoprocessodeemancipação
de mulheres escravas e o doutorado em
História com um estudo sobre migração de
libertos no período pós-abolição, ambos pela
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Realizoupós-doutoradonaNewYorkUniversity
sobre associativismo afro-brasileiro e afro-
americano nas primeiras décadas do século
XX. É professora da Universidade Estadual
Paulista (Unesp). Participa do Núcleo Negro de
Pesquisa e Extensão (NUPE) da Unesp sendo
coordenadora local e participante do Conselho
da Comunidade Negra do Estado de São Paulo
e do Centro de Investigação Transdisciplinar
“Cultura, Espaço e Memória” (CITCEM). Suas
áreas de interesse são Escravidão e Pós-
emancipação, Diáspora Atlântica, História da
África, Ensino de História e Gênero. Coordenou
o Programa de Pós Graduação em História da
Faculdade de Letras e Ciências (FCL) de Assis
de 2013 a maio de 2017.
João Pedro Ferreira
Reportagem, Edição e Diagramação
Lucas Lutti - STAEPE
Colaboração Técnica
Esta é uma publicação da Faculdade de Ciências e
Letras de Assis, Núcleo Integrado de Comunicação.
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