Anais do 1º Colóquio Internacional de Texto e Discurso - CITeD - page 571

Este conceito de “arte interessada” opõe-se, portanto, ao conceito de “l’art pour
l’art”. O artista deve ser livre para se expressar, mas deve transmitir uma mensagem.
Segundo Alfredo Bosi, esta ideia já estaria presente em textos de 1925, nos quais Mário
de Andrade reagia contra a arte “parnasiana do mestre alienado que acabava de ser
eleito príncipe dos poetas brasileiros” (BOSI, 1985, p. 387). Ainda nesse mesmo ano, ao
fazer uma resenha da obra
Feuilles de Route
, de Blaise Cendrars, publicada na revista
Estética
nº 3, o escritor paulista afirma:
Poesia é uma arte. Toda arte supõe uma organização, uma técnica, uma disciplina que
faz das obras uma manifestação encerrada em si mesma. A obra de arte é antes de mais
nada uma organização fechada, em toda criação artística deve haver a
intenção
da obra
de arte. Essa intenção é que a torna uma entidade valendo por si mesma, desrelacionada.
Desrelacionada, não quero dizer que não possa ter intenções até práticas de moralização,
socialização, edificação, etc., quero dizer que se torna livre da percepção temporal
vivida da sensação e do sentimento reais. (ANDRADE, 1925, p. 327)
Em 1929, o cronista volta a discutir o papel da arte e do intelectual, referindo-se
a Julien Benda (1867-1956) para contrastar a atitude dos intelectuais franceses com as
dos intelectuais brasileiros, sendo que a palavra “clerc” (“pessoa instruída”) utilizada no
texto refere-se à obra
La trahison des clercs
, do escritor francês. Vê-se, portanto, que há
na crônica de Mário um diálogo com a obra francesa e com o contexto histórico
vivenciado pelo Brasil da época.
Nesta obra, publicada em 1927 e reeditada em 1946, Julien Benda discute o
papel dos intelectuais da época, especificando que “a contemplatividade do “clerc” às
direitas não impedia este de se manifestar a respeito dos movimentos políticos e tomar
parte neles” (ANDRADE, 2005, p. 131), diferentemente do pensamento de Bérgson, a
cuja filosofia racionalista o escritor se opunha.
Regina Salgado Campos (1996) explica que o livro de Benda trata da questão da
“introdução da política na arte”, compreendendo-se política como “adesão” a valores
morais diferentes dos vigentes na sociedade burguesa, como a Verdade, a Justiça e a
Razão. A pesquisadora comenta que essa discussão torna-se mais acalorada logo após a
Primeira Guerra Mundial:
Na época da primeira edição, o ataque de Benda se dirigia a Maurras, Barrès e Péguy, e
seu respectivo nacionalismo. Valeu ao autor críticas de direita e de esquerda. Em 1946
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